Conseguir estar ou não motivado não é um desafio exclusivo de profissionais autônomos, empreendedores e freelancers. A diferença é que é muito fácil não levantarmos da cama no dia que não queremos.

Não tem chefe para dar um aviso, ponto para bater ou emprego para perder. As tarefas do dia não são dadas por outras pessoas, mas sim criadas e aceitas por nós mesmo. Nesse contexto de liberdade que tanto almejamos, apenas assumindo a responsabilidade e mantendo a motivação alta podemos avançar em nossos projetos e negócios.

Nesse artigo da série Desafios da Autonomia vou comentar um pouco sobre a automotivação. Por que é importante estarmos motivados? O que nos faz perder a motivação? Como trabalhar nossa mente para nos automotivar? Vou passar por várias questões como essas e explorar um pouco uma visão sobre o assunto.

Se você ainda não conhece a série, acompanhe aqui os demais artigos.

O que é a motivação e porque ela é importante?

Quando eu era adolescente minha mãe me levou para conversar com um psiquiátra. O diagnóstico de depressão veio como resultado de um padrão que vinha se repetindo de falta de interesse nas coisas, pouco desejo pela vida e dificuldade de fazer qualquer outra coisa além de deitar na cama.

A depressão, que no espectro dos sentimentos humanos está do extremo oposto da motivação, põe em evidência a importância dessa tal motivação.

Naturalmente, é muito fácil falar/escrever sobre motivação e muito difícil realmente trabalhá-la. Contudo, quero compartilhar com você um pouco de alguns pensamentos que tanto me ajudaram naquela época quanto ainda me colocam em um caminho de maior clareza.

Acredito que dos verbos ‘ser e estar’, a motivação se identifica mais com o segundo. Não conheci até hoje uma pessoa que simplesmente é motivada porque nasceu assim. A motivação não é necessariamente uma constante, mas sim uma característica que pode ser nutrida.

Há algo, no entanto, que muitas vezes esquecemos mas que é super importante nesse assunto. A motivação não é necessariamente o que nos faz agir e fazer as coisas. A nossa resiliência ou músculo da força de vontade vai além de estarmos ou não motivados e nos move mesmo em momentos de desânimo para executar as tarefas e objetivos de cada dia. Parte da automotivação está relacionada com nossa capacidade de agir estando ou não motivados.

Contudo, na minha percepção a motivação é derivada de dois pontos:

  1. Nosso equilíbrio interno emocional
  2. A compreensão daquilo que nos coloca para baixo

Eu tenho a opinião que naturalmente somos seres motivados. Isto é, temos algo interno que pulsa e nos faz correr atrás do que ou desejamos ou necessitamos. Talvez por natureza a motivação exista mais fortemente para suprir as necessidades físicas e, em seguida, sociais que temos como seres humanos. Porém, num mundo atual em que comida vem em pacotinho, podemos devotar a atenção da nossa motivação para elementos mais abstratos como carreira, fama, status ou dinheiro.

O equilíbrio emocional é o alinhamento entre nossos reais desejos – aqueles que vem do coração e não só da razão – e nossas ações. Esse ponto é tópico para outra discussão.

Já a compreensão daquilo que nos põe para baixo, segue adiante.

Por que desmotivamos?

Agora que já entendemos um pouco mais sobre o que é a motivação, quero destacar algumas situações que acontecem – sejam em nossas cabeças ou externamente – que desafiam nosso estado motivado.

Buscar a motivação em recompensas imediatas

Muitas vezes ficamos todos animados para um novo projeto. Compramos um curso online, conversamos com algumas pessoas e colocamos a mão na massa. Tudo anda muito bem até que uma semana passa…duas…1 mês….e o resultado não vem da forma que antes imaginamos e o desânimo começa a tomar forma.

Como vivemos em um mundo muito imediato, acabamos pensando que o sucesso de nossos projetos também seguira a mesma velocidade de uma tendência de posts no Instagram. O que raramente será verdade.

É importante nos atentar para esse tipo de expectativa que colocamos em nós mesmos pelos resultados que queremos gerar. As recompenças imediatas que estamos nos acostumando com likes e compartilhamentos nas redes sociais nos mal acostumaram.

Se importar com a falha

Seguindo o ponto anterior, há outro fator que nos impede muitas vezes de manter os ânimos lá em cima: a falha.

Nossa cultura ainda é muito crítica com a falha. Temos vergonha de dizer que falhamos em algo. O orgulho fica pressionando nossa comunicação para ou desmerecer nossos esforços ou colocar a culpa em fatores externos. Afinal, “se falhei ou é porque não tentei com todas as minhas forças ou porque algo me atrapalhou”.

Nesse caso, é preciso dar uma chance para a humildade e aceitar que algumas vezes mesmo a gente fazendo nosso melhor nós vamos falhar. E está tudo bem.

Não começar

Muitas vezes a dificuldade de nos motivar não vem pela falha ou pelas expectativas que colocamos, mas simplesmente por não tirarmos algo do papel.

Quem nunca teve uma ideia de criar um projeto, estudar algo ou mudar um hábito e aquela vontade ficou só no plano das ideias?

Quanto mais esse tipo de situação é procrastinada, ou seja, não iniciada, menor o ânimo ou a força da motivação que a acompanha.

Acreditar na imagem de sucesso da mídia

Se você entrar no meu Instagram agora verá uma versão da minha vida que quero compartilhar. Fotos bonitas, com pessoas bacana, em lugares lindos. Essa é a imagem que eu quero passar para os outros e reafirmar para mim mesmo, mas também é uma imagem que não necessariamente representa 100% dos meus dias.

Quando visamos um trabalho autônomo e livre, muitas vezes temos o imaginário daquela pessoa na praia com o laptop e um drink na mão. Trabalhando 2 horinhas por dia e fazendo milhões com a internet.

A verdade é muito diferente disso.

O grande problema aqui não é que a vida é diferente disso, mas é que acreditamos que é assim que outras pessoas estão vivendo e nos frustramos quando nos deparamos com a realidade: provavelmente muitas horas e dias dentro de casa trabalhando sem muitas emoções.

Querer seguir as expectativas dos outros

Outra causa muito comum de falta de motivação é querer viver a partir das expectativas que os outros geram em nós.

Se pararmos para pensar, provavelmente identificaremos ações que fazemos que não necessariamente estão alinhadas com nossos objetivos ou com aquilo que nos motiva. Seja seguir uma carreira que nossos pais “apoiam” ou querer fazer algo porque nosso cônjuge gosta, provavelmente a pressão dessas ações e satisfação das expectativas alheias drenam nossa energia.

O tempo inteiro as pessoas vão colocar expectativas em nós e temos a opção de tentar satisfazer essas expectativas ou nos impor para mostrar como realmente queremos viver.

Se comparar aos outros

Em geral a mídia só nos mostra os extremos. Os melhores do mundo e os piores do mundo. O resultado é que nos comparamos com os melhores e tememos ser os piores…e no caminho esquecemos que a maior parte das pessoas está na média.

Assim como o tópico anterior, não é só os outros que tentarão nos pressionar para agir de determinada maneira. Também fazemos isso com a gente mesmo.

Se um colega está feliz num trabalho, por que não estou? Se uma amiga comprou um carro, por que não comprei o meu? Se o primo casou, por que ainda eu não casei?

Tendemos a achar que a vida é uma corrida, mas no fundo não precisamos nos comparar com ninguém. A comparação gera frustração pois “sempre a grama do vizinho é mais verde”. Só que não necessariamente queremos uma grama no nosso quintal…e se olharmos de perto pode ser que a grama seja verde porque é artificial.

Acreditar nas suas justificativas

Nossa cabeça é o instrumento mais poderoso para a criação de boas justificativas para nos impedir de avançar naquilo que deveríamos.

Temos justificativas para tudo.

Não tenho dinheiro, não tenho tempo, não acho que vai dar certo, o mercado não está bom, não tenho as habilidades, não sou dígno, etc, etc.

Quando temos uma vontade de fazer algo interessante e que nos tire da zona de conforto, uma das primeiras coisas que nossa cabeça tenta fazer é arrumar uma justificativa para nos manter nessa zona de menor esforço ou conforto.

São justificativas super plausíveis. Porém, o que elas fazem é cortar nossa motivação se acreditamos nelas.

Focar apenas no resultado

Quando criamos um projeto ou traçamos uma meta, em geral damos muita ênfaze no resultado final. Aonde queremos chegar com isso tudo. Aí traçamos a estratégia, planejamento e partimos para a ação.

Seja o resultado algo rápido ou demorado, existe um pedaço de tempo grande entre a sua idealização e o seu resultado. Esse tempo é o tempo da execução.

Se focamos apenas no resultado vamos ter um sério problema de motivação, pois a maior parte do tempo está nesse meio termo e é nele que nos perdemos.

O tempo de execução raramente vem sem desafios, problemas, mudanças de curso e reajustes. É importante sim ter a visão de onde queremos chegar e do porquê começamos qualquer projeto na vida. Contudo, é muito difícil ficarmos motivados por algo tão abstrato quanto “o futuro”.

Focar em algo no futuro como fonte de motivação funciona até certo ponto. Podemos alimentar nosso imaginário com os prêmios, benefícios e status que vamos ganhar quando atingirmos o resultado que queremos com nossas ações, mas provavelmente essa abstração sozinha não aguentará como fonte de motivação os centenas de desafios ao longo do caminho.

Para haver uma real motivação que aguenta pancada, é preciso curtir o processo de se chegar até o resultado e realmente colocar intenção e propósito nas ações do dia a dia, não só em algo que um dia pode chegar.

Buscar por motivação externa

Para finalizar, não acredito que a motivação seja algo que encontramos externamente. Não é em objetos, lugares ou mesmo em outras pessoas. A real motivação parte de nós mesmos. Da confiança que temos em nós mesmo e do alinhamento entre o que nosso coração nos diz, o que a mente entende e o que executamos no dia a dia.

De onde vem a motivação e como podemos nos automotivar

Como comentei, a motivação vem de um equilíbrio interno o qual, por sua vez, é derivado do alinhamento entre nossas ações e o que nosso coração acredita que é o correto.

Para destrinchar mais isso, precisamos então entender o que significa essa vontade do coração. Eu acredito que todos nós temos algo interno que nos guia. Seja esse guia algo que decidimos antes de vir para a terra, seja ele adquirido ao longo da nossa vida ou mesmo influenciado por outras pessoas e culturas não importa. Temos algo que sentimos e conseguimos identificar se o que estamos fazendo está alinhado ou não com essa “vontade do coração”.

Inclusive, mais do que saber se estamos fazendo algo que está alinhado com esse propósito, é ainda mais fácil identificar quando não estamos alinhados.

Repare que utilizei agora o termo “propósito”. Em várias linhas de coaching, religião ou filosofia vemos esse tipo de palavra que identifica um intuito, divino ou não, que serve como guia.

Na minha opinião, a real motivação vem quando seguimos um caminho alinhado a esse propósito. Contudo, nem sempre podemos agir alinhados a esse propósito ou sequer sabemos qual ele é. Isso quer dizer que não poderemos ficar motivados? Não é bem assim também.

Movitação sem propósito

Existe sim formas de nos motivar mesmo que não seguindo conscientemente nosso propósito ou alinhamento com a ‘vontade de nossos corações’. A partir do momento que executamos qualquer ação podemos lembrar das razões pelas quais estamos executando esse trabalho e isso pelo menos vai nos mover.

A razão pode ser simples como ganhar dinheiro ou mais complexa. Porém, só até esse ponto não é suficiente. Temos que lembrar para quem estamos fazendo o que fazemos.

‘Para quem’ e ‘por que’ são as duas perguntas mais fortes que você pode fazer para buscar ânimo e executar o que precisa com mais vontade e determinação.

Além disso, é interessante um terceiro elemento para completar: O sonho.

Quando falamos que algo é um sonho nosso parece que é algo inalcançável ou complexo, mas é importante darmos atenção aos desejos que aparecem na nossa cabeça e considerá-los como possibilidades.

Há alguns anos eu sonhei em não precisar trabalhar para outras pessoas ou empresas. Apesar de na época eu nem saber se isso seria possível eu corri atrás para construir e buscar soluções para fazer esse sonho uma realidade.

Ao mesmo tempo, lembro de pensar em outros sonhos que não achei que seriam possíveis e que hoje acredito que poderia ter conquistado se tivesse acreditado neles. Eu queria ser piloto de avião uma época da minha vida, mas não passou de treinar um bocado no jogo de simulação do computador.

Dar atenção aos desejos e sonhos que aparecem, muitas vezes sem sabermos de onde, pode ser um caminho para descobrir seu propósito.

Motivação com propósito

Se você já entender um pouco mais sobre para qual caminho seu propósito ou vontade interna quer te levar, então é muito mais simples a situação. Naturalmente o que mencionei acima serve imensamente para contribuir para a motivação, porém pode ser que seja ainda mais poderoso ter em mente sempre esse propósito.

Provavelmente o próprio fato de agir alinhado(a) com a vontade do coração já vai transformar os ânimos e estará mais frequentemente motivado(a).

Porém, o desafio ainda continua de controlar e organizar a vida para evitar que os elementos que mencionei acima não avacalhem seus dias e façam com que mesmo que um propósito bem definido seja suficiente para levantar da cama com emoção e vontade de viver.

Motivação como o mar

Uma analogia interessante é o mar. Pense que você está numa praia. Sua resiliência é a água e as ondas a motivação.

Um dia a maré estará baixa e você vai trabalhar ou fazer suas coisas normalmente, mas com um pouco de lentidão ou dificuldade.

Outro dia, a maré aumentará e você, cheio de energia, acelera para fazer tudo que precisa!

Independente da maré, as ondas vem e vão e, mais do que isso, são muito influenciadas pelo vento – um fator externo.

Muitos de nós vivem assim, aceitando que um dia a maré está alta, outro dia está baixa e todos os dias torcendo para ter um vento que aumente a quantidade de ondas.

E a automotivação? Você pode pensar que – seguindo a analogia e lembrando que está relacionada com assumirmos a responsabilidade por ela – seria tentar controlar quando o vento vem ou mesmo criar uma piscina de ondas artificial. Porém, na minha opinião a chave para a automotivação é entrarmos mais fundo na água, onde estamos sempre banhados com a capacidade de ação e as ondas simplesmente fazem ainda parte do mar.

Conclusão

Espero que tenha gostado desse artigo. O intuito dessa série não é trazer a solução para os problemas e desafios dos profissionais autônomos, mas sim de mostrar um pouco dos dilemas e reflexões que estão frequentemente presentes na nossa vida de autonomia.

Se você curtiu, comenta abaixo como você lida com a motivação e vamos continuar a conversa por lá.

Divirta-se!