Revisitando as Humanidades na Era da Inteligência Artificial
De certa forma, muitas pessoas veem o cenário atual como um jogo de soma zero – onde a computação, as habilidades técnicas e a ênfase em STEM acabam ofuscando aquelas antigas disciplinas de arte, cultura e linguagem. Não há dúvida de que estamos entrando em um novo mundo, no qual a tecnologia assume um papel ainda maior. Contudo, nem todos acreditam que as humanidades estejam mortas ou obsoletas, ou que não devam orientar os jovens no sentido de explorá-las.
Paul Alivisatos, presidente da Universidade de Chicago, afirmou, durante uma entrevista, que as ferramentas de inteligência artificial estão transformando as oportunidades para os estudantes universitários. Segundo ele, “realmente acreditamos na educação com um currículo básico, mas cada vez mais as pessoas também desejam desenvolver uma visão computacional e estatística”. Alivisatos ressaltou que, daqui para frente, as pessoas precisarão ser criadoras e co-criadoras junto à IA, o que exigirá uma adaptação a grandes mudanças tanto no processo de aprendizagem quanto em diversas outras áreas.
Inteligência Digital e Pensamento Crítico
Em um artigo publicado no Phys.org, a professora Alexa Joubin, da George Washington University, discute a IA como uma “ferramenta heurística” para as humanidades e explica como ela pode transformar nossa forma de pensar:
“A IA pode simular fluência, mas ela não pensa de forma inerente. Cabe aos educadores garantir que os alunos compreendam suas limitações e aprendam a formular melhores questões. Em vez de tratarmos a IA como uma máquina de respostas, podemos utilizá-la para aprofundar a investigação e redefinir o pensamento crítico nas humanidades.”
Em outras palavras, a inteligência artificial pode atuar de forma assistiva. De fato, ao ouvir diversos especialistas discutindo o avanço da IA, nota-se uma forte ênfase no desenvolvimento de tecnologias que ampliam as capacidades humanas, em vez de substituí-las. Trata-se de ferramentas de apoio à decisão que tornam o trabalho humano mais produtivo e eficaz.
A Revolução do No-Code
Durante a conversa com Mittal, Alivisatos fez referência a uma das tendências mais disruptivas dos últimos tempos: o movimento no-code. Pela primeira vez, com os novos modelos de linguagem de grande porte, é possível desenvolver softwares sem precisar conhecer linguagens de programação. Desde os anos 1970, quando aprendemos a utilizar os computadores, era necessário dominar linguagens como FORTRAN ou COBOL para criar qualquer aplicação. Hoje, podemos simplesmente solicitar à IA que desenvolva o software e obter um código-fonte impecável.
Embora essa realidade seja impulsionada pelas capacidades da inteligência artificial, ela já possui precedentes no design digital. No início da internet, era comum os usuários escreverem seu próprio HTML para construir páginas, mas com o surgimento de ferramentas como o Dreamweaver, os webmasters passaram a criar sites sem necessidade de codificação. Agora, o conceito de no-code está disponível de maneira ainda mais ampla: os usuários finais não precisam ser especialistas em tecnologia – basta saber se comunicar efetivamente com a IA.
Investimento e Apoio às Humanidades
Há também importantes iniciativas que continuam incentivando o trabalho nas humanidades, mesmo em um momento de grande destaque para a inteligência artificial. Por exemplo, o National Endowment for the Humanities (Fundo Nacional para as Humanidades) opera uma série de programas voltados ao financiamento de estudos nesta área. Um dos programas concede até US$ 750.000 para universidades e organizações de pesquisa independentes, com o objetivo de criar centros dedicados ao estudo das implicações éticas, legais e sociais da inteligência artificial.
Independentemente das incertezas sobre o financiamento federal, esse é apenas um dos diversos programas implementados para apoiar e fortalecer as humanidades na economia americana. Ao comentar essa tendência e outras, Alivisatos enfatiza que a inteligência artificial está ampliando as oportunidades – não retirando-as, mas transformando a maneira como inovamos e nos destacamos como seres humanos.
“O que vejo é, para nossos alunos, uma expansão de oportunidades em todos os setores. De repente, conseguimos fazer com que o conhecimento trabalhe melhor para nós. Isso criará ainda mais oportunidades para as pessoas, nunca menos. Portanto, acredito que os estudantes devem encarar esse momento, assim como as instituições, como uma oportunidade imensa, e não com receio”, concluiu.
Tudo isso indica um compromisso em preservar o que é essencialmente humano, mesmo enquanto a inteligência artificial avança em termos de cognição e capacidade de decisão. Fique atento(a) a novas transformações nesse cenário.