A queda nas visitas internacionais aos EUA
Olja Ivanic aguardava com entusiasmo a chegada de alguns primos da Suécia à sua casa em Denver, em junho. Ivanic e os quatro viajantes planejavam fazer trilhas no Colorado e, depois, visitar Los Angeles e São Francisco. Contudo, em fevereiro, durante uma reunião na Casa Branca em que o presidente Donald Trump repreendeu o presidente ucraniano Volodymyr Zelenskyy, os quatro parentes cancelaram imediatamente sua viagem e optaram por passar as férias na Europa. “A forma como ele tratou um presidente democrático em meio à guerra foi além da compreensão”, afirmou Ivanic, CEO dos EUA da startup de saúde Longevity Labs com sede na Áustria.
Previsões otimistas versus a realidade
A indústria turística dos EUA esperava que 2025 fosse mais um ano de sucesso para os visitantes estrangeiros. Em 2024, o número de chegadas internacionais saltou e as projeções indicavam que, neste ano, os números alcançariam os níveis anteriores à pandemia. No entanto, apenas três meses depois do início do ano, os números vêm despencando. Muitos turistas de outros países, irritados com os arancelos e a retórica de Trump, e alarmados com relatos de prisões na fronteira, estão optando por destinos alternativos.
Dados preliminares e revisões das projeções
O Escritório Nacional de Viagens e Turismo do governo divulgou dados preliminares mostrando que, em março, as visitas internacionais aos EUA caíram 11,6% em comparação com o mesmo mês do ano anterior. Esses números não incluem as chegadas do Canadá – que serão divulgadas posteriormente – nem as travessias terrestres a partir do México, onde o tráfego aéreo caiu 23%. Para o período de janeiro a março, 7,1 milhões de visitantes entraram no país, uma queda de 3,3% em relação ao mesmo período de 2024. A empresa de previsões Tourism Economics, que até dezembro esperava um aumento de quase 9% nas chegadas, revisou sua estimativa para prever um decréscimo de 9,4% neste ano.
Impacto no mercado canadense e outras fontes
A Tourism Economics aponta que uma das maiores quedas ocorrerá nas chegadas vindas do Canadá, que foi a maior fonte de visitantes em 2024, com mais de 20,2 milhões, segundo dados do governo dos EUA. O Flight Centre Travel Group Canada informou que as reservas para destinos de lazer nos Estados Unidos caíram 40% em março, em comparação com o mesmo período do ano anterior, e a Air Canada já reduziu a programação de voos de primavera para destinos como Flórida, Las Vegas e Arizona devido à baixa demanda.
Revisões de expectativa e opinião de especialistas
Embora o Escritório Nacional de Viagens e Turismo tenha previsto um aumento de 6,5%, totalizando 77,1 milhões de chegadas com a expectativa de que os números ultrapassassem os níveis de 2019 somente em 2026, a Tourism Economics acredita que a percepção negativa dos EUA no exterior pode manter as chegadas abaixo dos patamares pré-pandêmicos até 2029. “Os dados indicam um significativo cancelamento de viagens e uma queda massiva na intenção de viajar”, afirmou Adam Sacks, da Tourism Economics.
Casos pessoais e reações à política de Trump
No Canadá, Ian Urquhart, professor emérito da University of Alberta, havia planejado uma viagem de cinco dias a Las Vegas para assistir a um show do Coldplay, mas cancelou o passeio para protestar contra o “tom incrivelmente depreciativo” de Trump em relação ao país, mesmo perdendo um depósito de US$ 500. Sua filha e seu cunhado também cancelaram viagens planejadas para Sedona, Arizona, e para um tradicional roteiro de golfe em Scottsdale, como forma de manifestar seu descontentamento com o tratamento dado ao Canadá.
Em Madri, Pepa Cuevas e seu marido, que planejavam passar um mês esquiando no Colorado durante as festas de fim de ano, optaram por viajar ao Japão. “A vitória de Trump nos deixou, especialmente a mim, muito chocados. No momento, perdemos o desejo de retornar aos EUA. Não sei o que acontecerá no futuro, mas agora estamos abalados e a situação ainda não parece se resolver”, disse Cuevas.
Queda na procura e os efeitos financeiros
Dados governamentais apontam que as chegadas internacionais da China caíram quase 1%. As viagens de lazer de chineses a destinos como a Disneylândia, Havaí e Nova York estão diminuindo drasticamente, e há expectativa de que a recuperação só ocorra após a saída de Trump do cargo, conforme destacou Wolfgang Georg Arlt, CEO do China Outbound Tourism Research Institute, ao denominar o fenômeno de “Trump Slump”. Essa retração pode resultar em uma redução de US$ 9 bilhões nos gastos dos visitantes internacionais nos EUA, segundo a Tourism Economics.
Outros impactos no cenário internacional
Marco Jahn, presidente e CEO da New World Travel, relatou que as reservas caíram entre 20% e 50% nas últimas oito a dez semanas, com declínios acentuados na Escandinávia, onde as repetidas ameaças de Trump de assumir o controle da Groenlândia – território autônomo do aliado da OTAN, Dinamarca – irritaram os moradores. “Os EUA não são vistos como um destino acolhedor”, afirmou Jahn.
Além disso, a plataforma Beyond, especializada em gestão de receitas para proprietários de aluguel por temporada, registrou uma queda de 44% nas buscas canadenses por aluguéis de curto prazo nos EUA após a imposição temporária, em 1º de fevereiro, de aranceles de 25% sobre produtos provenientes do Canadá e México. Richard Groesz, diretor de contratos da American Ring Travel, também destacou que, embora os passeios de ônibus com pegada ecológica dos EUA atraiam turistas europeus, as reservas provenientes da Alemanha se estabilizaram após o apoio de Elon Musk a um partido de direita nas eleições federais daquele país.
Mudanças nas preferências dos viajantes
Enquanto os Estados Unidos sempre foram o principal destino para turistas japoneses, dados da JTB Tourism Research & Consulting indicam que, em janeiro, a Coreia do Sul assumiu a liderança nas chegadas de turistas. Takaaki Mitamura, porta-voz da agência de viagens Veltra Corp, com sede em Tóquio, atribuiu essa mudança principalmente ao enfraquecimento do iene, fato que faz com que viajantes busquem destinos menos afetados pela variação cambial, como Coreia do Sul, Taiwan, Tailândia e Austrália.
Haruka Atomiya, residente em Tóquio, que visita Los Angeles pelo menos uma vez por ano, contou que no último ano precisou pesquisar bastante para encontrar hospedagens acessíveis, já que a taxa de câmbio fez com que os preços de alguns hotéis dobrassem ou triplicassem. Apesar de não compreender a escolha dos americanos na eleição de Trump, Atomiya afirmou que continuará visitando os EUA, a menos que sinta qualquer risco físico. “Se a América mudar de forma visível, é uma realidade, e provavelmente continuarei visitando. O que acontecerá com os EUA depois de Trump me intriga”, concluiu.