LOS ANGELES (AP) — Quando tratores equipados com inteligência artificial passaram a ser disponibilizados para vinhedos, Tom Gamble quis ser um dos primeiros a adotá-los. Ele sabia que haveria uma curva de aprendizado, mas decidiu que a tecnologia valia a pena ser explorada.
O agricultor de terceira geração comprou um trator autônomo. Ele planeja utilizar o recurso de direção autônoma nesta primavera e já está usando o sensor de IA do trator para mapear seu vinhedo no Napa Valley. À medida que o trator aprende cada fileira, ele saberá para onde ir quando operar de maneira autônoma. A inteligência artificial incorporada à máquina processa os dados coletados para ajudar Gamble a tomar decisões mais bem informadas sobre suas culturas – o que ele denomina “agricultura de precisão”.
“Isso não vai substituir completamente o trabalho manual — que é uma das coisas de que mais gosto —, mas permitirá que você trabalhe de forma mais inteligente, com mais precisão e, no final, tome decisões melhores com menos fadiga”, afirmou.
Gamble disse que planeja usar essa tecnologia o máximo possível por imperativos econômicos, de qualidade do ar e regulatórios. Segundo ele, os tratores autônomos podem colaborar para reduzir o consumo de combustível e diminuir a poluição.
Conforme a IA continua a se expandir, especialistas afirmam que a indústria do vinho demonstra como as empresas podem integrar a tecnologia de forma eficiente para complementar a mão de obra, sem necessariamente substituir os empregos. Inovações agrícolas, como a inteligência artificial, podem auxiliar os produtores a reduzir o desperdício e administrar vinhedos de forma mais sustentável e eficaz, monitorando o uso de água e determinando quando e onde utilizar insumos como fertilizantes e produtos para controle de pragas. Tratores e sistemas de irrigação equipados com IA podem minimizar o uso de água através da análise do solo e das videiras, além de proporcionar dados mais precisos sobre a saúde das culturas e as projeções de safra.
Outros segmentos da indústria do vinho também têm adotado essa tecnologia, desde o uso de IA generativa para criar rótulos personalizados até o emprego do ChatGPT para desenvolver, rotular e precificar garrafas inteiras.
“Não vejo ninguém perdendo o emprego, porque acredito que as habilidades dos operadores de tratores vão se aprimorar e, como resultado, eles poderão supervisionar uma pequena frota dessas máquinas, sendo justamente remunerados por esse aumento de qualificação”, comentou.
Gamble destacou que os agricultores estão sempre se adaptando. Houve temores quando os tratores passaram a substituir cavalos e mulas no trabalho agrícola, mas aquela tecnologia “se provou”, assim como a tecnologia de IA na agricultura deverá se comprovar, lembrando que a adoção de qualquer nova tecnologia sempre demanda tempo.
Empresas como a John Deere já começaram a utilizar a mesma IA que os vinicultores estão começando a adotar. O gigante agrícola emprega, por exemplo, a tecnologia “Smart Apply” em seus tratores, que ajuda os cultivadores a aplicar materiais para a retenção das culturas por meio de sensores e algoritmos que detectam a folhagem presente nos vinhedos, conforme explicou Sean Sundberg, gerente de integração de negócios na John Deere.
Esses tratores, ao utilizar essa tecnologia, pulverizam apenas onde há uvas, folhas ou outros elementos necessários, evitando a aplicação desnecessária de produtos. No ano passado, a empresa anunciou um projeto com produtores do Condado de Sonoma para usar essa tecnologia a fim de maximizar a produção das vinhas.
Tyler Klick, da Redwood Empire Vineyard Management, afirmou que sua empresa já começou a automatizar as válvulas de irrigação dos vinhedos que gere. As válvulas enviam um alerta em caso de vazamento e se desligam automaticamente caso detectem uma taxa de fluxo de água “excessiva”.
“A válvula, na verdade, está começando a aprender o consumo típico de água. Ela identifica quanto de água é utilizado antes que a produção comece a cair”, explicou Klick. Segundo ele, cada válvula custa aproximadamente US$600, acrescidos de uma taxa de assinatura de US$150 por acre ao ano.
“Nosso trabalho na viticultura é ajustar nossas operações às condições climáticas que enfrentamos. Consigo ver a IA nos ajudando a lidar com essas condições específicas”, comentou.
Angelo A. Camillo, professor de negócios do vinho na Sonoma State University, observou que, apesar do entusiasmo com a IA na indústria do vinho, alguns vinhedos de pequeno porte demonstram ceticismo quanto à sua viabilidade. Segundo ele, as operações familiares — que correspondem a cerca de 80% do setor vinícola nos Estados Unidos — estão gradualmente desaparecendo, pois muitos não dispõem dos recursos necessários para investir em tecnologia de IA. Por exemplo, um braço robótico que auxilia na montagem de paletes de vinho pode custar até US$150 mil.
“Para as pequenas vinícolas, surge a interrogação em relação ao investimento e, também, à capacitação. Quem vai operar todas essas aplicações de IA? Onde ocorrerá o treinamento?”, questionou.
Camillo também apontou desafios relativos à escalabilidade. Drones podem ser úteis em vinhedos menores, possibilitando que a IA direcione a aplicação de insumos somente para culturas afetadas por pragas; entretanto, administrar, por exemplo, 100 drones em um vinhedo de 1.000 acres, além de contar com profissionais de TI especializados, seria significativamente mais complexo.
“Não acredito que uma pessoa consiga gerenciar 40 drones trabalhando em conjunto. Isso impõe uma limitação à adoção de certas tecnologias pelos operadores”, concluiu.
Por outro lado, a IA se mostra extremamente eficaz no monitoramento da saúde das culturas — avaliando tanto o desempenho das plantas quanto o desenvolvimento das folhas — e no acompanhamento das uvas para auxiliar na previsão de safras, disse Mason Earles, professor assistente e líder do Laboratório de IA e Biofísica Vegetal na UC Davis.
Ele ressaltou que doenças ou vírus podem, de forma silenciosa, aniquilar vinhedos inteiros, o que ele chamou de “o elefante na sala” no setor vinícola. O replantio e a recuperação de um vinhedo comprometido podem levar, no mínimo, cinco anos. A IA, nesse contexto, pode ajudar os produtores a identificar qual vírus está afetando as plantas e determinar se é necessário retirar imediatamente parte das culturas para evitar prejuízos ainda maiores.
Além disso, Earles, cofundador da plataforma de gerenciamento agrícola alimentada por IA, Scout, explicou que sua empresa utiliza inteligência artificial para processar milhares de imagens em poucas horas e extrair dados de maneira rápida, tarefa que seria extremamente complexa se realizada manualmente em vinhedos que se estendem por centenas de acres. A plataforma da Scout conta e mede o número de cachos de uva ainda na fase inicial de floração, possibilitando uma previsão mais precisa da produção.
Quanto antes os viticultores souberem a quantidade estimada de produção, melhor poderão ajustar seus processos de vinificação. “Prever a produção ao final da temporada ainda é um desafio, mas é fundamental, pois determina tanto a mão de obra necessária quanto os insumos para a produção do vinho”, afirmou.
Earles não acredita que a introdução da IA em vinhedos esteja “afastando os agricultores”. Ao contrário, ele prevê que a tecnologia será cada vez mais utilizada para auxiliar em trabalhos de campo desafiadores e para identificar problemas nos vinhedos que precisem de intervenção.
“Os agricultores já foram alvos de tentativas de oferecer tecnologias há décadas. A agricultura é uma atividade difícil e menos previsível em comparação a outras profissões. Quanto à contagem e monitoramento, imagino que muitos já teriam preferido que uma máquina assumisse essa tarefa há muito tempo”, concluiu.